Por
Solano Portela
Fico
impressionado como tantos cristãos embarcam na visão político-econômica
socialista. Não me espanta que ela leve de roldão grande parte da
“intelectualidade” do mundo ocidental, bem como aquelas cabeças não pensantes,
que seguem a opinião majoritária por pura necessidade de aceitação comunitária.
Afinal, o socialismo é uma visão bem humanista que enaltece a bondade nata das
pessoas. Nada que nos surpreenda que ele seja abraçado por aqueles que não
gostam da realidade do Deus verdadeiro, revelado nas Escrituras, com seus
princípios de justiça e demandas de soberania plena. O que me assusta é o
contorcionismo teológico e exegético feito por alguns para achar na Bíblia
justificativa para sua crença socialista (ou, quiçá, marxista), ignorando as
evidências contrárias e os princípios que contradizem essa corrente de pensar.
Nesse
sentido, recebi há um tempo uma carta dizendo que temos o registro bíblico de
que as terras alocadas ao Povo de Israel, quando este adentrou a palestina,
foram repartidas igualmente. Todos teriam recebido porções semelhantes. Isso
seria uma prova do ideário socialista nas Escrituras. Acontece que a afirmação
simplesmente não corresponde à realidade.
As tribos
se posicionaram em locais diferentes de acordo com a circunstância da conquista
e conforme as alianças (algumas espúrias) que foram fazendo. Umas terras eram
mais férteis do que outras; umas mais planas e aráveis do que as da tribo
vizinha; e assim por diante. As determinações iniciais para a repartição
colocaram aquele povo em movimento, mas depois ele foi seguindo o curso da
história, com as desigualdades características de qualquer sociedade ou sistema,
com o pecado presente no coração das pessoas – se bem que sempre sendo
confrontado com a Lei de Deus. Essa lei visava punir o faltoso, proteger o
inocente, preservar certos direitos individuais, de propriedade e impedir que
os carentes fossem abandonados na sua fraqueza.
Assim, na
teocracia estabelecida à nação de Israel o código civil e penal foi colocado
para garantir as liberdades individuais e para lidar com as manifestações do
pecado. Nunca houve a visão ingênua de que a “terra prometida” era um lugar sem
pecado e sem a necessidade de controles. Um desses controles, admitimos, era a
proibição de grandes latifúndios, com a reversão de transações comerciais
processadas ao longo dos anos, à tribo e aos proprietários originais.
Esse
dispositivo, de limitação latifundiária, é um sistema interessante e, como todo
o resto da legislação civil e judicial de Israel, de extremo valor didático
para nós, mas não tem caráter normativo. Deveríamos pensar como tais
salvaguardas poderiam ser implantadas em nossa sociedade, estudando
cuidadosamente o contexto de suas circunstâncias, pois emanaram de um Deus que
é todo sabedoria. Mas enquanto procuramos abstrair o princípio, não há
determinação de aplicabilidade idêntica ou in totum à nossa
sociedade. Não devemos esquecer, também, que o direito de propriedade privada é
plenamente assegurado não apenas na legislação civil e judicial do estado
judaico vetero-testamentário, mas na própria lei moral, com o oitavo mandamento
(“não furtarás”), repetidamente reafirmado em todo o restante da Bíblia,
inclusive no Novo Testamento.
Não
existe, portanto, nada que se situe mais longe do sistema teocrático de Israel
do que o socialismo, comunismo ou marxismo. Querer ler isso nos registros
históricos do Povo de Deus, é caminhar em terreno pantanoso que tragará a
argumentação e o seu defensor – se praticar coerentemente o que prega.
Reconhecendo
isso, alguns proponentes mais insistentes passam a defender que a visão
socialista é algo típico do Novo Testamento, apelando ao registro de Atos
2.42-47 – à comunidade de bens. Mas a exegese correta do relato, à luz do
contexto textual e histórico, não fornece qualquer base para um modelo
comunista de governo aplicável às nações da terra. Primeiro, temos aqui um registro
histórico-descritivo de um micro-cosmo social existente entre cristãos,
não uma definição prescritiva aos governos e governantes (um texto prescritivo
é, por exemplo, a passagem claramente anti-socialista de 2 Ts 3.10 – “se
alguém não quer trabalhar, também não coma”). Segundo, temos um contexto
histórico no qual a igreja se encontrava acuada e sob perseguição, na perene
tentativa satânica de destruição dela. Terceiro, temos o caráter voluntário da
iniciativa da comunhão dos bens, e não estatalmente determinativo; isso é
substanciado, em adição, pelo próprio Pedro nas palavras proferidas a Ananias e
Safira.
Precisamos,
como cristãos, reconhecer que essa moda de subscrição à cartilha socialista,
que perdura há várias décadas, é carente de sustentação teológica e capenga em
uma premissa que é totalmente anti-bíblica: a bondade natural do homem.
Qualquer
sistema de governo, seja qual for o seu rótulo, que reconheça certas bênçãos
advindas da graça comum divina – como o direito à liberdade, à iniciativa individual,
à propriedade privada – e que tenha em sua estrutura salvaguardas e controles
que lidem com o pecado e a violência, tem mais possibilidades de refletir
princípios de justiça divina e prover com que as riquezas do país sejam
revertidas em benefício dos cidadãos que o compõem, diminuindo assim a
perspectiva de fome, carências e violências.
O governo
eficaz respeita a propriedade, controla e pune malfeitores (não o empreendedor
e o cidadão ordeiro comum); essa é a função primordial dele, conforme Rm 13.
Depois disso, ele reconhece e galardoa os cidadãos de bem, principalmente
certificando-se nãode que todos sejam iguais,
mas de que todos possuam iguais oportunidades de
desenvolverem suas individualidades e talentos específicos.
Vi e li no Bereianos

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